Por Luiz Gustavo Freire
Durante minha primeira semana fiquei à procura de hostels de long-term como um louco, até que dia 30 finalmente encontrei um perfeito para mim. O Yoha@Henderson é o que tem a melhor infraestrutura, o melhor preço e tudo isso a uma distância de aproximadamente uns 30 minutos da SMU. Quartos de quatro pessoas, academia, quadra de basquete e até um laguinho com peixes bem simpáticos. O que eu mais gostei no hostel foi a sua localização, não por ter que quase atravessar a cidade para chegar na faculdade, mas por ser um lugar sem estrangeiros. Com exceção do Yoha@Henderson, todas as residências nas proximidades são compostas por cingapurianos. Criarei um post somente sobre o albergue, tenho umas histórias muito boas para contar e elas merecem um texto a parte.

Logo na frente do hostel, ao cruzarmos a Henderson Road, verifica-se a presença um food court relativamente grande e local. Muitas vezes é bem difícil entender o que os vendedores falam, o Singlish deles é bem puxado. Meu pai já dizia “Gu, independente de onde você estiver viajando, a palavra “Turista” sempre estará escrita em sua testa.” e eu concordo 100% com ele. No entanto, aqui no sudeste asiático, esse vocábulo está sublinhado, em Caps Lock e grifado com um marca-texto amarelo bem chamativo. Eu digo, é óbvio que sou um estrangeiro, é só olhar para mim. Isso é bom em algumas situações e ruim em outros momentos. Eles, na maioria dos negócios, podem me sacanear (improvável que isso ocorra em Cingapura, mas ainda sim possível), assim como tratam de falar um Singlish mais comportado (por saber que não sou de lá). Agora, especificamente no food court da Henderson Road, eles assumem que você já mora em Cingapura há um tempinho, pois o local não é turístico. Ou seja, eles falam um Singlish agressivo, e de vez em quando é difícil saber o que você está comendo.

Caro leitor, se seu desejo ao embarcar nessas terras é aprender inglês, não venha. O Singlish é uma mistura entre o inglês britânico e o Mandarin. Parte da pronúncia do Singlish leva em consideração as vogais chinesas, ao invés das inglesas, além de um uso exacerbado de expressões locais. Sugiro fortemente outros destinos como EUA, Canadá, ou Grã-Bretanha para estudar a língua inglesa.
Eu estou gostando bastante da comida por aqui, a variedade de alimentos nos food courts é impressionante, sem falar nos temperos que são muitos saborosos, com a exceção do chilli, que como um bom paulistano, eu odeio. As praças de alimentação possuem estabelecimentos especializados em diferentes tipos de culinária tais como a chinesa, coreana, japonesa, tailandesa, malaia, indiana e até de western food. Ou seja, dias após daquele susto pregado pelo Bryan e Ray, já me via bem mais tranquilo, e até um pouco animado com relação à comida.
Já com relação aos estudos. Posso dizer que no final das contas fiquei extremamente satisfeito com as matérias que escolhi, principalmente dado à maneira com as escolhas foram feitas. Para escolher os cursos, a faculdade lhe disponibiliza 100 unidades, e realiza-se um leilão para encher as salas. A questão é que do outro lado do mundo é um tanto quanto complicado saber quais são as matérias mais concorridas e quais demandam mais unidades para se conseguir uma vaga. Com isso, boa parte de seu planejamento inicial de sua grade horária vai por água a baixo. Como critério de escolha de matérias, dei prioridade para aquelas que não conseguiria fazer no Brasil. Pensei, também, que elas talvez pudessem me ajudar em minha adaptação na Ásia como um todo, e não somente em Cingapura.
Em minha primeira aula, eu ainda estava me acostumando à cidade, e nada mais natural do que tomar um susto ao descobrir que você é o único ocidental matriculado na matéria, mesmo contando com a presença de outros dois alunos intercambistas (uma chinesa e um coreano). O professor é indiano e fala um inglês muito lento, tornando a aula um pouco monótona, mas o conteúdo do curso é extremamente interessante. O nome da matéria é Shipping Business. Gostei muito da profundidade abordada na aula, com estudos sobre tipos de navios, tipos de cargas e principais rotas comerciais. A matéria contrastou muito bem com o curso de Mandarin, que é logo após Shipping Business. Se a aula fosse ministrada no Brasil, eu diria que a professora cheira cocaína antes das aulas, mas como estamos em Cingapura, vou chutar que é pó de café mesmo. Ela é muito acelerada cara. O xixi dela é conhecido mundialmente como Red Bull Energy Drink. Já no primeiro dia, bem no comecinho da aula, estava falando umas palavras que eu não conseguia decifrar. E o pior, a classe respondia. Pensei no mesmo momento “Pronto, estou matriculado em uma aula de Mandarin nível avançado, rodei”. Depois descobri que eram palavras de conversação básica, e que os alunos as sabiam através de um contato inconsciente e super esporádico com a língua. É com alguém te cumprimentar em italiano ou francês, como buongiorno ou bonjour, por exemplo. A questão é que eu não sabia o básico do básico do Mandarin, e aquilo, juntamente com o estilo frenético da professora, me assustou inicialmente.

Graças a deus, tenho certa facilidade no aprendizado de línguas estrangeiras e consegui acompanhar o restante da turma. Nela, reparei que aproximadamente 25% da sala é composta por intercambistas.
Já a terceira matéria, Economic Development in Asia, me deu agonia antes mesmo do início da primeira aula. Cheguei 5 minutos antes da aula, e o professor estava se ajeitando para começar. Quando faltava 1 minuto, ele estava 100% pronto e sentou em sua cadeira e ficou encarando o relógio da classe. Ele não piscava meu. Eu conseguia sentir sua ansiedade correndo por suas veias para que aquele minuto terminasse. Passaram-se 40 segundos e ele parecia uma estátua, sem piscar. Quase levantei e disse:
– Tudo bem professor, pode começar a aula, são 20 segundos, ninguém vai morrer se o senhor der início agora.
Após me controlar para não dizer aquilo, eu já estava dando risada e pensando “Nossa, o cara é muito frito hahaha!”. Sério, teve um intervalo em que ele chegou uns 10 segundos antes do horário combinado, correndo, suando e todo desarrumado. Ele jogou tudo a mesa e teve exatos 2 segundos para respirar fundo e reiniciar a aula. Just in time. Eu, é claro, dei muita risada, pois não verei isso novamente, ainda mais no Brasil. Ele, basicamente, ensina diversas teorias econômicas e as aplica em países asiáticos. Grande parte das teorias já aprendi no Insper, o que é novo para mim é a aplicação na Ásia, no entanto sempre é bom dar uma revisada praticar a aplicação das ferramentas econômicas.
Na matéria de Islamic Law, Banking and Commerce, fiquei receoso ao descobrir que o professor titular do curso é americano, de Virgínia mais especificamente. O estado de Virgínia integra o famoso Bible Belt, e eu tinha certa preocupação com o viés que pudesse estar embutido na aula.

Mas com o desenrolar da apresentação pessoal do professor descobri que não seria o caso. Ele trabalhou diversos anos com Islamic Banking e deu aulas sobre a Lei Islâmica durante boa parte da vida, isso me deixou com o nariz menos torcido. Esse se trata de outro curso que achei super interessante também, e vale ressaltar que não é uma aula religiosa, e sim um curso sobre Islamic Banking e Islamic Commerce, o ponto é que é impossível aprendê-los sem ter uma boa noção sobre a cultura e os costumes islâmicos.
Deixe um comentário